quinta-feira, 29 de maio de 2008

Libelo

De que mais precisa um homem senão de um pedaço de mar - e um barco com o nome da amiga, e uma linha e um anzol pra pescar? E enquanto pescando, enquanto esperando, de que mais precisa um homem senão de suas mãos, uma pro caniço, outra pro queixo, que é para ele poder se perder no infinito, e uma garrafa de cachaça pra puxar tristeza, e um pouco de pensamento pra pensar até se perder no infinito...
De que mais precisa um homem senão de um pedaço de terra -um pedaço bem verde de terra - e uma casa, não grande, branquinha, com uma horta e um modesto pomar; e um jardim - que um jardim é importante - carregado de florde cheirar? E enquanto morando, enquanto esperando, de que mais precisa um homem senão de suas mãos para mexer a terra e arranhar uns acordes de violão quando anoite se faz de luar, e uma garrafa de uísque pra puxar mistério, que casa sem mistério não vale morar...
De que mais precisa um homem senão de um amigo pra ele gostar, um amigo bemseco, bem simples, desses que nem precisa falar - basta olhar - umdesses que desmereça um pouco da amizade, de um amigo pra paz e pra briga, um amigo de paz e de bar? E enquanto passando, enquanto esperando, de que mais precisa um homem senão de suas mãos para apertar as mãos do amigo depois das ausências, e prabater nas costas do amigo, e pra discutir com o amigo e pra servir bebida à vontade ao amigo?
De que mais precisa um homem senão de uma mulher pra ele amar, uma mulher com dois seios e um ventre, e uma certa expressão singular ? E enquanto pensando, enquanto esperando, de que mais precisa um homem senão de um carinho de mulher quando a tristeza o derruba, ou o destino o carrega em sua onda sem rumo ? Sim, de que mais precisa um homem senão de suas mãos e da mulher - as únicas coisas livres que lhe restam para lutar pelo mar, pela terra, pelo amigo ...

Vinicius de Morais

quarta-feira, 14 de maio de 2008

vou me apropriar do texto dos outros mais uma vez!!!

O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o quê, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.”

Ítalo Calvino

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Ausência

A sua ausência é o que me cala a boca,
é o que me entristece,
é o que me faz sentir incompleto.

A sua ausência é o que dói mais em mim,
é o que dilacera minha alma,
e o que causa marcas em meu corpo.

O que é a vida senão ausências e presenças,
idas e vindas,
partidas e chegadas.

O que é a vida senão aprender a viver com a ausência de quem se ama, ou com a presença de quem se despreza,
O que é a vida senão aprender.